quinta-feira, 19 de junho de 2014

MÍDIA E SEGURANÇA PÚBLICA: COMPLEXIDADES E DESAFIOS

MEDIA AND PUBLIC SECURITY - COMPLEXITIES AND CHALLENGES


Marta Renata Freitas Alves
Manoel Jorge da Silva Sousa
Edvan da Silva Rogério
Marilena Costa Chaves
Kleison José Oliveira de Albuquerque
Francisco Wallace da Rocha Neto


This paper aims to make some reflections about the complexity and the interaction of the Public Security with the media. To achieve such purpose, Edgar Morin’s Theory of Complexity was used as basis of this research in order to understand the relations of the Public Security with the media by using of analyses of bibliographic and netnographic content as methodological resources. The qualitative, comprehensive and explanatory research sought to reflect about the nature of the relationship between media and Public Security, its complexities and challenges.

Keywords: Public Security. Media. Complexity. Interaction.


INTRODUÇÃO
            
A globalização e a mídia atualmente fazem parte do desenvolvimento de qualquer comunidade. Partindo desta perspectiva, é essencial entendermos a comunicação como um elemento basilar de qualquer sociedade, pois a mídia ocupa hoje, também no campo da segurança pública, um papel fundamental na conjuntura contemporânea da sociedade brasileira, pois tem sido protagonista de serviços de informação, contribuindo muitas vezes positiva ou negativamente na complexa formação da opinião social.
O confronto da polícia com a criminalidade, da forma exposta pela mídia, já se encontra hoje de tal forma impregnada no coletivo inconsciente, que se pode afirmar, sem chance de erro, que o fenômeno atravessa todas as classes e níveis culturais, povos e civilizações, e as informações decorrentes deste embate se consagraram como bem de consumo essencial, disponível gratuitamente a todos em milhares de noticiosos televisivos, através da mídia impressa e virtual e todas as demais formas pagas e gratuitas de divulgação, mais nos impressionando por sua constante atualização, pois atualmente as ocorrências policiais são noticiadas de forma instantânea.
Este contexto é, pois, sem dúvida, um terreno fértil para a realização de um trabalho proativo da imprensa, em parceria com as forças responsáveis pela manutenção da Ordem Pública, de forma a erradicar esta realidade perversa. Mas não é isso que de fato ocorre.
Justamente nesse campo é que se situa essa análise, pois a informação difundida através da mídia, que despeja um discurso midiático indutor da crença à inoperância dos dispositivos de segurança pública e afasta-se do seu papel social que é garantir informação, acaba seguindo outro viés, gerando sensação de insegurança; e a atividade policial acaba sendo cada vez mais analisada de modo simplista e taxada de ineficaz, de maneira que o confronto da polícia com a criminalidade descamba em novo confronto: mídia e segurança pública.
Este trabalho foi, portanto, concebido com o intuito de tecer reflexões sobre essa complexidade e a interação da Segurança Pública com a mídia no Brasil e ainda discutir os desafios da segurança pública de reverter, na complexidade midiática, o descredenciamento das instituições de segurança. Para isso, utilizou-se como aporte metodológico a Teoria da Complexidade de Edgar Morin para analisar e compreender a interação dessas instituições. Para complementar, o presente trabalho também se valeu dos resultados das pesquisas empreendidas por Silva (2012) e Ramos e Paiva (2007), através da análise de conteúdo bibliográfico e netnográfico, com pesquisa de natureza qualitativa, compreensiva e explicativa, buscando refletir a natureza das relações entre mídia e segurança pública, suas complexidades e desafios.

COMPLEXIDADES E DESAFIOS

Conforme observa Fraga (2001), o ato violento não está limitado a quem o sofre, pois se estende e afeta quem o pratica, bem como quem lhe vê os resultados. Isso nos remete ao princípio hologramático da teoria da complexidade. A informação, difundida e obtida através da mídia, não tem gerado segurança ou trazido a prevenção ao fenômeno da criminalidade. A atividade policial, mantenedora da ordem pública e da paz social é cada vez mais analisada não em seus múltiplos meandros e enfoques, mas simplificada em seu confronto com a criminalidade, ao casuísmo do cotidiano policial, numa postura maniqueísta, manifestada passivamente pelo indivíduo anônimo, que se sente como alvo potencial de delinquentes empenhados em transgredir a lei.
Assim como outras áreas que envolvem as relações humanas, a mídia aqui será tratada com a importância que lhe é peculiar. Será analisada não apenas como veículo de informação, mas com a vontade de ter nessa ação comunicativa um saber necessário a ações não repetitivas que podem alienar ou escravizar aqueles que a reproduzem ou aqueles que sofrem as suas influências quando as recebem. Assim, nosso objetivo é entender o jornalismo como uma ciência alicerçada na sua complexidade, numa ética social que lhe dá a possibilidade não de escravizar e ou alienar, mas que leve o leitor à episteme do jornalismo que liberta e constrói a dicotomia de informar e formar opinião do público ouvinte.
Entendendo a epistemologia como o estudo do conhecimento, da teoria das ciências, e da validação do saber científico, não se concebe o jornalismo na sua complexidade como algo pobre, superficial e condenado à mediocridade de quem o pratica e que o afasta desse conceito epistemológico. A notícia por sua vez é produto dos acontecimentos sociais e do pensamento humano, portanto fruto de uma praxe complexa e que segue a ideologia dominante. Conforme se observa, “Toda vida, cada vida, a vida de toda a sociedade só pode ser multidimensional. Não de maneira harmoniosa, complementar e realizada, mas no conflito, no dilaceramento, na contradição” (MORIN, 1986: 123).
“Se a complexidade não é a chave do mundo, mas o desafio a enfrentar, por sua vez o pensamento complexo não é o que evita ou suprime o desafio, mas o que ajuda a revelá-lo, e às vezes mesmo a superá-lo” (MORIN, 2006: 8). Assim, o jornalismo deveria ser palco de inovações e obrigações de responsabilidade sociocultural capazes de promover, na técnica, verdadeira transformação na sociedade contemporânea, que se orienta na fluidez infinita das informações veiculadas. Contrariamente, a maioria dos jornalistas tem uma tendência à superficialidade, a serem limitados pela ideologia dominante e, portanto, condenados a uma prática direcionada à mediocridade do sensacionalismo de mercado, de maneira que o que hoje ocorre é uma prática desenfreada de transmissão e que muitas vezes foge do seu real objetivo, que é o da informação compromissada com a imparcialidade e com a verdade e não voltada para a espetacularização, transformando a violência em moeda política, servindo mesmo para garantir notoriedade, espaços no campo mediático, fontes de recursos econômicos e de poder.
A partir daí, surgem vários questionamentos quanto à postura da imprensa diante do impacto social da matéria a ser divulgada e o modo como será divulgada. Uma pesquisa realizada por Ramos e Paiva (2007) mostrou que os grandes jornais do país dedicam um espaço bastante expressivo para divulgação de matérias relacionadas à polícia, violência e criminalidade, ou seja, esse tema é pauta diária e com um grau de relevância altíssimo nos periódicos brasileiros de grande circulação. No entanto, o problema não está aí. A preocupação surge quando a mídia gera ou acentua a sensação de insegurança e violência na sociedade através de notícias sensacionalistas e tendenciosas, que beiram o espetáculo.
            A imprensa, por sua essência, é formadora de opinião e responsável por comportamentos e tendências sociais. Assim, ao noticiar matérias sobre violência e criminalidade, deve fazê-lo com compromisso de informar a verdade dos fatos, permitindo que o leitor faça sua própria análise. Porém, quando se trata de segurança pública, violência e criminalidade, o que se observa é a veiculação exacerbada de notícias fortemente carregadas de emoção, que direciona a opinião de quem as recebe. Na visão de Souza (2005), a mídia, ao divulgar, espetacularizar, sensacionalizar e banalizar os atos de violência está amplificando a linguagem da violência e instituindo a cultura do medo. Dessa forma, a eficiência e a eficácia da polícia no combate à violência tem sido medida pela sociedade a partir no cenário mostrado pela mídia, já carregado de impressões e ideologias tendenciosas do canal que o divulga.
Nesse sentido, Silva (2012), em sua pesquisa sobre as relações da Segurança Pública e da mídia com a sociedade, apresenta questionamentos acerca de uma manipulação e direcionamento feito pela mídia através da veiculação das notícias ou se é a própria sociedade que chega às suas conclusões baseada nas suas experiências de medo e insegurança. Assim, a autora conclui que é necessário fazer uma distinção dentre o que a mídia veicula [produção] e o que depois de veiculado circula pela sociedade [recepção], e que retorna em forma de um terceiro sistema, o de “resposta”.
Entende-se, assim, que esse retorno abrange não só o que foi veiculado e o que foi percebido pela sociedade, mas as diversas conclusões geradas sobre a violência e a Segurança Pública, determinadas conforme as vivências e a cultura das comunidades.
 Não se pode desconsiderar, portanto, que uma notícia mal transmitida, carregada de sensacionalismo, leva a uma distorção do “real” e ao descrédito das instituições de Segurança Pública.  Por outro lado, é na mídia que a sociedade encontra uma forma de defesa de seus direitos, à medida que a exploração das notícias de criminalidade, além de mostrar os equívocos das políticas de Segurança Pública, pode mobilizar as autoridades, impulsionando uma necessidade de mudança e aprimoramento institucional.

Assim, fica claro que transformações na sociedade e cultura trazem impactos em diversos campos e disso resulta um incremento de complexidade nas relações entre a instituição Segurança Pública, especialmente organizações policiais, e a mídia, causando conflitos que, conforme o contexto, podem ser considerados como negativos ou como indicativos de necessidade de mudança, aperfeiçoamento e desenvolvimento, exigindo uma maneira construtiva de lidar com novas formas de comunicação. (SILVA, N.N., 2012, p. 17)


Hoje, para ser eficaz, a polícia tem de atuar de forma legal, dentro das normas do estado de direito, e ainda conquistar legitimidade, legitimidade esta ratificada pela opinião pública tendo a imprensa como aliada nesse processo.
Para Fraga (2001) o jornalista deve, portanto, cercar-se de uma noção de equilíbrio, devendo informar o real, mas sem sensacionalizar essa realidade; deve sim operar um trabalho proativo de imprensa, de forma a erradicar esses desvios, pois hoje a mídia é reconhecida como fundamental na implantação e no sucesso de políticas públicas, incluindo as de segurança, de modo que é salutar buscar essa sintonia entre mídia e segurança.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do poder inquestionável que a mídia exerce sobre a vida das pessoas, o grande desafio do Estado é agregar a força da sociedade com todas as suas formas de representação, a partir de seu envolvimento com as ações de prevenção e repressão à violência e à criminalidade. É importante desconstruir a ideia banalizada de violência e de criminalidade, exposta através da mídia sensacionalista, cuja atitude pode ser definida também como uma forma de violência, ou seja, uma violação do direito à privacidade e à dignidade humana.
Em oportuna reflexão, Silva (2012) ensina que se não se consegue mudar os valores que orientam o olhar da mídia sobre os setores populares dificilmente se conseguirá avançar em direção a uma cobertura mais equilibrada. O autor ainda observa que é inegável o peso e a importância da mídia na formação de consciência e de opinião do cidadão, além da sua função precípua de informar, entreter e divulgar.
A partir desta perspectiva, é possível afirmar que a mídia pode fazer de sua atividade algo mais conscientizador, sensibilizador aos gestores públicos e ao público em geral, transcendendo para um jornalismo mais interpretativo do que meramente comercial e apelativo, afinal jornalismo, assim como a segurança pública, é prestação de serviço, sendo compensadora a reflexão sobre o relacionamento entre a Polícia Militar com a imprensa na promoção da paz social. 

RESUMO

Este paper objetiva fazer reflexões sobre a complexidade e a interação da Segurança Pública com a mídia. Para isso, partiu-se da Teoria da Complexidade de Edgar Morin para entender tais relações. Utilizou-se a análise de conteúdo bibliográfico e netnográfico como recurso metodológico. A pesquisa, de natureza qualitativa, compreensiva e explicativa, buscou pensar a natureza das relações entre mídia e segurança pública, suas complexidades e desafios.

Palavras-chave: Mídia. Segurança Pública. Complexidades. Interação.

REFERÊNCIAS

FRAGA, Luis Alves de. Reflexões sobre o mundo actual: problemas sociais contemporâneos. Porto: Campo das letras, 2001.

MORIN, Edgar. Para sair do Século XX. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.

____________. Introdução ao pensamento complexo. Porto Alegre: Sulina, 2006.

RAMOS, Silvia e PAIVA, Anabela. Mídia e violência: novas tendências na cobertura de criminalidade e segurança no Brasil. IUPERJ, 2007, Rio de Janeiro.

SILVA, N. N. Segurança Pública, Mídia e Sociedade: Complexidade e Interação. C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.5, n.1, p.4-24, jan./dez. 2012.

SILVA, José Maria da e SILVEIRA, Emerson Sena da. Apresentação de trabalhos acadêmicos: normas e técnicas. 7 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012.

SOUZA, Robson Sávio Reis. Mídia e violência: o papel da imprensa na segurança pública. em 07/11/2005 na edição 354. Artigo disponível em http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/o-papel-da-imprensa-na-seguranca-publica. Acesso em 04.06.2014.

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