SAPORI, Luís Flávio. Políticas Públicas
de Manutenção da Ordem Pública. In: Segurança
Pública no Brasil: desafios e perspectivas. Rio de Janeiro: Editora FGV,
2007. P. 69-93.
RESENHA
Marta Renata Freitas Alves
Manoel Jorge da Silva Sousa
Edvan da Silva Rogério
Marilena Costa Chaves
Kleison José Oliveira de Albuquerque
Francisco Wallace da Rocha Neto
O texto “POLÍTICAS
PÚBLICAS DE MANUTENÇÃO DA ORDEM PÚBLICA” é o terceiro capítulo do livro “Segurança
Pública no Brasil: desafios e perspectivas”, publicado pela Editora FGV, em 2007.
O autor é Luís Flávio Sapori, doutor em Sociologia pelo Instituto Universitário
de Pesquisas do Rio de Janeiro – IUPERJ (2006). Atualmente Sapori é professor
do curso de Ciências Sociais e coordenador do Centro de Estudos e Pesquisa em
Segurança Pública (CEPESP) da PUC Minas. Tem experiência na área de Sociologia,
com ênfase em Sociologia do Crime e da Violência. Atua principalmente nos temas
de justiça criminal, polícia, organizações, violência policial e violência.
Neste trabalho o autor aborda
o fenômeno da deterioração da ordem pública nas cidades e a ineficácia das
políticas de segurança pública no combate à criminalidade. Trata também dos
conceitos de políticas públicas e sua relação com a provisão dos serviços de
educação, saúde, habitação e emprego como fatores capazes de reduzir a
criminalidade e afirma ainda ser possível implementar ações governamentais mais
eficientes no controle da violência, em parcerias público-privadas, tendo como
base o conceito de responsabilidade social não só como um atributo exclusivo do
Estado, mas de todos, incluindo Estado, o mercado, o setores privados e a
sociedade civil organizada.
Especificamente no capítulo estudado, Sapori
analisa os condicionantes institucionais das atividades do Estado pela
manutenção da ordem pública. Tais condicionantes estão relacionados, segundo
ele, à dificuldade de viabilizar uma política pública coerente e que seja capaz
de integrar as diversas organizações do sistema de justiça criminal. O autor
afirma que a manutenção da ordem pública envolve necessariamente o exercício da
governança, cujo conceito ele apresenta como sendo o gerenciamento de redes ou a
coordenação interorganizacional, visando à interação mútua dos integrantes do
sistema de justiça criminal.
Embora Sapori considere
o governo apenas como um dos atores que influenciam o curso dos eventos na rede
social, não podendo exercer seus desejos e vontades, destaca que a governança
contribui para a implementação de políticas públicas em setores diversos.
Assim, ele tem como uma de suas hipóteses que a ação do Estado, do sistema de
justiça criminal é capaz de impactar em alguma medida a incidência de
criminalidade, a partir de uma conjugação de esforços da polícia, da justiça e
das prisões.
O autor chama atenção
para o poder de veto sobre algumas instituições, que dificulta a ação estatal
na área de segurança pública, pois à medida que isso ocorre pode invalidar ou
desqualificar as ações da polícia, ao referendar ou não a autoria e
materialidade de um possível crime. Afirma que a competência governamental para
promover a ordem pública, com eficácia e eficiência fica comprometida, mas não
inviabilizada. Porém, enfatiza que não existe consenso quanto à eficiência e à eficácia
do sistema de justiça criminal na redução da criminalidade.
Vista a situação por
esse prisma, fica evidente que isso leva a um “dissenso cognitivo entre os decision makers”, que reflete nas
políticas públicas nesta área. Cita como exemplo a “controvérsia” em torno da
política de tolerância zero de Rudolph Giuliani em nova York, na década de
noventa. De um lado apresentou reduções de 50% nos índices de homicídio,
“passando a se constituir num paradigma de política pública bem sucedida de
redução da criminalidade”, inclusive exportado para diversos países.
Entretanto, estudos apontaram que a redução foi observada em todas as grandes
cidades americanas no mesmo período. Além disso, recebeu muitas críticas quanto
à atuação voltada para setores empobrecidos da população norte-americana, como
negros e latinos, sendo encarada como uma ferramenta de opressão das camadas
mais pobres, desconsiderando os fatores econômicos. Afirma então que este
debate delineia uma dicotomia entre políticas preventivas e políticas
repressivas, ou entre políticas distributivas e políticas retributivas.
Há que se observar,
contudo, que as políticas de segurança pública norte-americanas foram baseadas,
até meados da década de 1970, pelo relatório da Comissão do Presidente sobre
aplicação da lei e administração da justiça, que apontava que o crime era
causado essencialmente pela desorganização social. A partir de então, com a
ascensão dos conservadores ao poder, houve uma guinada nas diretrizes de
segurança pública, que teve continuidade nos governos subsequentes, inclusive
democratas. Com essas mudanças os investimentos se deram nas polícias, no
ministério público e na legislação penal. Assim, do início da década de 1980
até início do novo milênio, a população carcerária triplicou. Na guerra contra
as drogas os investimentos foram feitos na repressão, tratamento e campanhas
educacionais. No âmbito acadêmico foram realizadas pesquisas a partir de
experiências empíricas para saber se prevenção ou repressão apresentava maior
grau de eficiência. Trabalho de pesquisadores coordenado por Lawrence Sherman
demonstrou que não é possível afirmar que as estratégias preventivas de
controle da criminalidade sejam mais eficientes que as repressivas, ou
vice-versa.
Vale ressaltar também
que o autor debate que a divergência entre políticas de repressão e políticas
de prevenção acabam prejudicando a eficácia e a eficiência das ações
governamentais de segurança pública. De um lado, têm-se as ações repressivas;
de outro, as preventivas. Tal polarização acaba reforçando uma disputa
desnecessária, impedindo a busca da articulação e da complementaridade. Ao
tratar ações repressivas e preventivas como elementos opostos e excludentes,
diminui-se a capacidade do Estado de prover a ordem pública efetivamente.
Segundo o autor, o que tem prevalecido é uma atuação segmentada do poder
público, priorizando uma ou outra ação, e raramente se vê simultaneamente ações
repressivas e preventivas.
Além de Nova York, Sapori
trata ainda da problemática de Bogotá, onde foi posta em ação, no período de
1994 a 2002, uma política de prioridade à segurança pública, ao longo de três
gestões políticas, com políticas de capacitação, prevenção e repressão, e o
mais importante, a continuidade à política de segurança desenvolvida,
demonstrando assim o interesse do Estado como um todo em desenvolver ações
concretas para o controle da criminalidade, com a interação da polícia e
sociedade e participação comunitária na política de segurança.
Tais ações combinaram
estratégias diversas pertinentes à prevenção e à repressão social. Essas
estratégias diziam respeito ao fortalecimento do organismo policial em todos os
níveis, como exemplo a capacitação através de cursos voltados para a área dos
direitos humanos e de polícia comunitária, bem como a reestruturação da
logística com aquisição de viaturas e equipamentos para o combate ao crime. Além
das medidas de caráter humano, foram feitos fortes investimentos na ampliação e
estruturação do sistema prisional, maior controle do consumo de bebidas
alcoólicas e do porte ilegal de armas de fogo, essas duas últimas entendidas
como fatores de risco.
Não se pode negar que os
investimentos e medidas adotadas deram resultados satisfatórios, pois foi uma
resposta imediata à proteção à vida da população carente por harmonia social à
época.
De todo modo, em
qualquer dos casos aqui analisados, embora não se possa mensurar quais medidas
ou ações (preventivas ou repressivas) se devam adotar para maior êxito no
combate à violência, a verdade que, tenham sido em caráter preventivo ou
repressivo, ambas foram de fundamental importância para os resultados obtidos,
ou seja, nada mais do que a persecução do objetivo primordial: a manutenção da
ordem pública.
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