“O mito de que o brasileiro é ‘criativo por natureza’ é
apenas isso, um mito. Em essência, o perfil autocrático da sociedade
brasileira, que desestimula a iniciativa das pessoas, faz com que o brasileiro,
de modo geral, tenha pouca criatividade”. A afirmação é do consultor Paulo
Benetti, da empresa Inteligência Natural, que falou dos paradoxos da
criatividade no CONARH 2009 - 35° Congresso Nacional sobre Gestão de Pessoas,
promovido pela ABRH-Nacional.
Segundo Benetti, as relações sociais no Brasil são
autocráticas, ou seja, espera-se que as idéias e as respostas venham sempre do
chefe, do líder, do presidente. Isso inibe drasticamente a criatividade, pois
não ser criativo passa a ser um fator de sobrevivência em um mundo que exige a
acomodação.
Ao ler estes pequenos parágrafos, extraídos de um
informativo publicado no site http://www.administradores.com.br/informe-se/informativo/criatividade-do-brasileiro-e-um-mito-avalia-consultor/23933/,
fui assaltado pelas seguintes indagações: e nas comunidades onde não há a
presença do poder público? E nos locais onde não há infra-estruturas sociais
mínimas como ruas trafegáveis, saneamento básico, energia segura, água tratada,
escolas, postos de saúde, segurança de qualidade? E nos lugares onde a
população, grande parte dela desempregada, vive sem regras, à larga, como Deus
criou batata, e a única relação social ou de poder que impera é a lei da
sobrevivência – aliás nada mais humano... ou desumano? Não seria um espaço
assim fértil em criatividade? Se a resposta for positiva, a afirmação de
Benetti não deve ser aplicada ao bairro Caladinho (em nossa capital), que vive
a exata realidade descrita nas minhas indagações. Por lá existe apenas o
assistencialismo barato de alguns agentes públicos e as visitas ou os agrados
esporádicos de indivíduos com pretensões políticas escusas que esperam pelo
momento certo da cobrança: o voto! Lá não há autocracia, não há chefes, não há o
que perder, não tem por que se preocupar, se acomodar ou esperar. Há apenas que
sobreviver.
À parte o infortúnio da pobreza e o abandono do poder
público, a comunidade do Caladinho é singular pelos seus modos e costumes, e eu
arrisco dizer que seus moradores são tão criativos quanto espirituosos, a
julgar pelas imaginativas placas, dentre tantas, que lá encontrei, e outras
tantas que pensei e criei em minha louca cabeça:
“Aqui mora gente!”
“Consertam-se políticos!”
Em que pese aos mais exigentes analistas, aparentemente as
duas frases parecem não guardar nenhuma relação entre si, mas se insistirmos
melhor na observação, podemos notar o seguinte:
Se na primeira está mais do que claro o pedido de socorro,
na segunda, aliás num português bem estruturado, diverso da educação que nos é
dada pela nação, não temos certeza se o letreiro traduz um sentimento de
revolta ou ingênua esperança. De todo modo, em ambas as placas, fica expressa a
criatividade irreverente de uma comunidade cuja única escolha foi não ter
escolha.
Desse ponto de vista, entendo que as mensagens geradas por
essa comunidade extrapolam o caráter meramente visual das placas, transcendem
as aspirações daquela gente e vão alcançar os mais suscetíveis em divagar em
interpretações, como eu.
Desta ótica, creio que há criatividade sim, mas uma
criatividade que atinge um aspecto social e psicológico delicado e bem
perceptível por quem está mais próximo dessa realidade, a exemplo de mim, do
leitor do blog e de outros tantos, que gostamos de pensar possibilidades. O
mesmo não podemos dizer dos políticos, que só vivenciam essas experiências uma
vez a cada dois anos. E o momento está chegando! É só prestar atenção nos
projetos de infra-estrutura alardeados por toda a cidade. No Caladinho não
seria diferente.
Mas esse povo relegado, como gente, como nós, tem a sua
importância. Certamente, com o período de campanha eleitoral que ora se
aproxima, serão tratados a pão-de-ló pelos candidatos ávidos por seus votos,
pois é só assim que são percebidos como entes socialmente relevantes,
considerando que “a única consciência social de político é o medo de perder voto”. E
é essa condição, o sufrágio, além da morte e das necessidades fisiológicas
básicas (dormir, comer, beber, urinar e defecar), que “iguala todas as criaturas num
único rebanho”, pelo menos no Brasil, pátria amada querida, more a
criatura no Caladinho ou na Chácara Ipê.
Vamos esperar, daqui por diante, que os moradores do
Caladinho não sejam visitados apenas em época de campanha eleitoral.
Afinal... bem... Nada
se paga pra sonhar!
Wallace Rocha
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