sábado, 21 de janeiro de 2012

Suicídio Mnemônico

Por Jokebed L. Taveira

Nossas ações (e também omissões) nos farão ser lembrados como canalhas, como homem ou como mulher?

Mas afinal, do que se trata? Doença da modernidade? Mal súbito? Estratégia norte-americana? Nova religião ou filosofia de vida? De certo ponto de vista, pode sim ser uma doença da modernidade. Em alguns casos, apenas mal súbito. Talvez seja uma estratégia de sobrevivência humana. Alguns realizam com tanta freqüência que já o assimilaram como filosofia de vida. Todavia, esta é uma prática tão antiga e companheira da espécie humana quanto são a covardia e o comodismo. Trata-se de uma tática milenar de caráter simbiótico, isso mesmo! ­─ uma relação mutuamente vantajosa. É vantajosa ao covarde que dela faz uso porque assim sofre menos; e vantajosa à outra parte porque assim tira o proveito que quiser sem ser importunado. Viu, mas finge que nada viu. Sentiu, mas sufocou a dor. Repete a si mesmo sempre a tarimbada frase: “O que os olhos não vêem o coração não sente”.
O silêncio é a morte; o morto nunca discorda. Jamais tem algo a dizer. Está sempre de acordo. A morte mnemônica, diferentemente da morte física, não é um rito de passagem, não é algo natural. A amnésia não pode ser tida como morte mnemônica, pois sendo resultado de um acidente, ou de uma doença, é reversível. O suicídio mnemônico é um caso bem mais específico. Assassino de lembranças, sufocador ideais, o suicida mnemônico mata toda e qualquer forma de racionalização que conteste a “ordem” vigente. É o típico jovem revolucionário que se transmuta em velho reacionário. Corrompido pelo poder, aliás, na maioria das vezes pelo conforto advindo do poder, torna-se um suicida mnemônico.
Mesmo quando senil ou esquizofrênico, o ser humano continua a ter lembranças, e freqüentemente recorre a elas. Sem a lembrança não há história, não há sequência, apenas a efemeridade de uma vida sem memória.
Se se morre um pouco a cada dia, se acertar é melhor que errar, se o conhecimento é o que nos torna superiores aos outros homo sapiens, por que então se acomodar, se amordaçar diante das discrepâncias, das incoerências aberrantes quando estamos assistindo ou somos atores co-adjuvantes do espetáculo? A vida se dissolve em um suspiro; e cada um de nós, uns por mais e outros por menos tempo, todos de alguma forma seremos lembrados. Cabe-nos, contudo, enquanto vida tivermos, fazer a seguinte introspecção: nossas ações (e também omissões) nos farão ser lembrados como canalhas, como homem ou como mulher?
Independente da resposta, um dado é relevante: na cultura ocidental capitalista moderna, que por acaso é a cultura na qual estamos inseridos, o suicida – seja ele físico ou mnemônico – é sempre lembrado como um fraco.

Um comentário:

Andrade disse...

Bom Dia
Gostei de os post e li todos, mas esse é na minha opinião o melhor de tods